Apesar de ser apaixonada por bichos, somente ao morar sozinha pude ter um. Já fazia ideia do quanto a vida animal é frágil e participei de algumas histórias bem tristes. Mas a verdade é que nada te prepara pra lidar com o vazio de uma perda trágica e repentina.
Os últimos dias foram bem difíceis. Fechamos a casa e abandonamos a dieta, nos refugiando com nossa gatinha mais velha para lamber as feridas em família e tentar entender tudo que aconteceu... Será que poderíamos ter feito algo diferente? Poderíamos salvá-lo?
Nesse momento eu percebi o quanto mudar o estilo de vida me transformou. Provavelmente há alguns anos isso seria o começo de outra crise depressiva. Mas agora tudo está diferente. A dor é profunda e inexplicável, mas por outro lado há força e aceitação de que a vida tem maneiras estranhas de agir.
Parece que minha mente foi "particionada" de certa forma. Razão e emoção não se confundem com tanta facilidade. É possível respirar fundo, reagir com certa frieza e depois chorar horas para aliviar a tensão.
Ao mesmo tempo que, em meio aos pensamentos ruins, surgem novas ideias. Será possível transformar o sofrimento em algo significativo? E se adotarmos mais um gatinho? E se ajudarmos uma ong?
Hoje me vi saindo do mercado com uma sacola para o mendigo que estava na porta com seu cão. Ironicamente o cão tinha ração, enquanto o mendigo morria de fome. Estou contando isso porque nunca antes observei a realidade com tanta clareza. Pela primeira vez pensei espontaneamente em transformar minha tristeza em algo construtivo. E como isso faz bem.
Agora parece já ser possível pensar no futuro... Por que não adotar um novo bichinho? Quantas vidas abandonadas sem a sorte de uma família para amar.
Sabemos que nenhuma vida é igual a outra e ninguém é substituível (nem mesmo os animais). Mas é possível redirecionar a atenção, o cuidado e dessa maneira trazer um novo sentido para seu dia a dia.
Entendi que o minimalismo faz isso com a gente. Não muda a dor, não faz com que doa menos, mas mantém a lucidez no presente e abre nossos olhos para as oportunidades e caminhos capazes de construir um novo amanhã.
Desculpem se pulei todo processo de sofrimento. Mas começo a perceber que este é um sentimento insistente e que não passa apenas com base na vontade. Eu ainda não superei a morte do gato. Ainda o vejo pela casa, sempre dócil e carinhoso. Penso em tudo que poderia ter feito para evitar a tragédia. Se ao menos tivesse um pouco mais de tempo...
Sei que vai demorar um pouco, mas é preciso sentir essa dor, chorar sempre que tiver vontade e deixar que o tempo cure as feridas. Afinal quem amamos sempre deixará suas marcas em nosso coração, sejam humanos ou peludos.
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