Armadilhas de consumo: como as marcas manipulam o seu comportamento


Enquanto desapegar ainda é um desafio para as pessoas mais comuns, as marcas seguem explorando o inconsciente coletivo para estimular necessidades de consumo. A pergunta que não quer calar é: Será que você está caindo nas armadilhas de consumo usadas para manipular o comportamento do consumidor?

Eu trabalhei 6 anos no marketing da indústria da moda. Ao descobrir o minimalismo e me aprofundar nas bases desse estilo de vida, a primeira reação foi sentir vergonha da minha profissão. Assim, passei a questionar cada vez mais o mercado até decidir que não queria mais fazer parte disso.

Não que eu seja contra o marketing e a existência de empresas. Porém, sou contra a falta de comprometimento das marcas com seus consumidores e com a sociedade. Acho absurdo empresas que faturam milhões por ano e não se engajam em nenhum causa.

Pense comigo... Sabemos que mais de 80% das riquezas do mundo estão nas mãos de apenas 1% da população. Os grandes responsáveis por fazer estas riquezas circularem são as empresas e indústrias. Não seria razoável que elas fossem as grandes promotoras de ações sociais e ambientais nas comunidades em que estão inseridas?

Apesar disso, a realidade é bem diferente. Então, se você também está cansado de sentir que está sendo manipulado para consumir mais, vem comigo descobrir as principais armadilhas de consumo das marcas para influenciar o seu comportamento:

Mais do mesmo: os apelos da vaidade

Verdade seja dita: as indústrias da moda e da beleza são mestras em te fazer desejar ter mais do mesmo no armário. Dessa maneira eles lançam uma coleção atrás da outra com o apelo de que você não pode perder essa novidade para "não ficar de fora", ou "não ser cafona", ou "ficar mais bonita".

Perceba que são apelos inconscientes às dores da vaidade presentes na vida de qualquer um. Elas sempre vão cutucar suas feridas e desejos mais íntimos para te convencer a não viver sem algo novo.


Obsolescência Programada: feito para quebrar

Sabe quando você lembra que antigamente os eletrodomésticos duravam uma vida inteira e percebe que hoje em dia não é mais assim? Pois este fato é verdadeiro. Logo nos primeiros semestres da faculdade de design já somos preparados para esta realidade.

A partir do momento que as tecnologias se popularizaram e tornaram-se acessíveis em todas as classes sociais, as empresas perceberam que os produtos tinham tanta qualidade que ninguém precisava comprar novamente. Logo nasceu a obsolescência programada, ou seja, o tempo de duração dos eletrodomésticos e eletrônicos passou a ser planejado.

Assim, as empresas não precisam mais se preocupar em fazer itens que durem mais tempo. Elas preferem usar matérias primas baratas para reduzir o custo e obrigar o consumidor a reinvestir nos próximos anos. Seja porque o produto anterior quebrou, seja porque a tecnologia foi superada.


Variações de Preços: estratégias invisíveis

Os apelos e variações de preço também escondem algumas verdades. Primeiramente porque toda marca possui uma margem de valor. Esta margem é calculada considerando todo ciclo de compras: custo, erros de produção, devoluções, trocas, lucro e promoções. Isso significa que ao comprar um lançamento normalmente você está pagando um preço muito acima do valor real desse produto.

Daí acontece algo interessante... Você passar por uma vitrine, vê um lançamento e fica apaixonado, mas está caro demais. Na ansiedade por ter o produto em primeira mão você parcela em mil vezes e paga o preço. Alguns meses depois a loja entra em liquidação e você tem vontade de morrer porque o mesmo produto caiu para metade do valor inicial.

Então veja que o mercado usa esta regra: pagar mais caro para ser exclusivo ou pagar mais barato para ser comum. E é claro que o marketing sempre tentará convencer que a exclusividade te transforma em alguém melhor que a "ralé comum". Parabéns, você mordeu a isca e foi enganado!


Embalagens: a sede de gerar valor

Muitos produtos parecem não valer o preço, certo? É por isso que muitas marcas investem em embalagens caras e bonitas, que encham os olhos do consumidor gerando mais valor para coisas insignificantes.

A indústria infantil evidenciou isso ao lançar a tendência dos brinquedos surpresa e criar a experiência única de desembrulhar toda embalagem até encontrar o brinquedo final. Assim, crianças de 5 e 6 anos têm passado horas no Youtube assistindo vídeos de pessoas abrindo coleções de brinquedos surpresa.

Uma febre perigosa e que merece atenção por parte dos pais. Afinal é preciso compreender que você está estimulando, desde muito cedo, um comportamento de consumo compulsivo e totalmente materialista. Que valores vão nascer a partir disso?


Sua melhor amiga: armadilha de consumo

Cada vez mais as marcas tentam se colocar no papel de amigas do consumidor. Mas será que são mesmo? É importante estar atento aos diferenciais, produtos e serviços oferecidos pelas empresas, pois muitas vezes este é um discurso vazio.

Quando uma empresa é sua melhor amiga ela se preocupará em entregar produtos de qualidade, respeitar os direitos e a saúde do consumidor e transformar sua experiência de compra em algo significativo. São marcas que investem em canais de atendimento com equipe treinada e se esforçam em responder para os clientes.

Além disso, são empresas conscientes do seu papel na sociedade e tentam beneficiar a comunidade ao seu redor. Por exemplo, eu conheço um empresário que é dono de farmácia num bairro carente da grande Porto Alegre. Ele está longe de ser milionário, mas promove ações solidárias anualmente, distribuindo brinquedos e promovendo festas para a comunidade local.

Por outro lado, conheço marcas que se dizem muito amigas e faturam milhões por ano, mas não são capazes de doar um par de sapatos novos para os funcionários da própria fábrica. Pelo contrário, tentam agradar os operários com amostras grátis de cosméticos próximos da validade. Muy amiga...

Amizade ou interesse?

Tendências: a arte das falsas necessidades

Sempre que surge uma nova tendência o mercado não sossega até explorar ao máximo todas as oportunidades de ganhar dinheiro com o segmento. Assim chegamos à era do consumo consciente e a quantidade de produtos "sustentáveis" não para de crescer.

Como exemplo vou citar o caso dos canudos reaproveitáveis de aço inox. Desde que São Paulo tomou a frente na proibição de uso dos canudos plásticos, muitos Estados passaram a seguir a mesma tendência. Aliás, um passo importante na redução do uso de plásticos que contaminam os oceanos.

Estaria tudo certo se não fosse o crescimento de uma campanha fortíssima apelando para o uso canudos reaproveitáveis, como se beber diretamente do copo fosse sinônimo de doenças e como se fosse necessário substituir o descartável pelo reaproveitável.

Daí você olha para a história e vê que o primeiro canudo foi patenteado somente em 1888... Isso significa que a humanidade sobreviveu milênios sem nunca precisar de canudinho, mesmo em condições de higiene infinitamente mais precárias que nos dias de hoje.

Pense nisso, pois algo me diz que em breve mais absurdos "sustentáveis" surgirão por aí...

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